quarta-feira, 20 de outubro de 2010

ENTREVISTA SITE VISTA



O fanzine MANUFATURA recebeu uma resenha na Revista VISTA # 28.
Nesta resenha havia a citação de uma entrevista comigo no site da revista, que acabou não sendo publicada por alguns desencontros e questões de tempo e espaço.

No mês passado, porém, o equívoco foi desfeito e a entrevista foi publicada no site da VISTA.

Feita pelo fanzineiro/jornalista Ricardo Tibiu do blog Chiveta, segue abaixo reproduzida. Agradecimentos ao Tibiu pelo apoio de sempre!

Quando muita gente dava por encerrada a circulação de fanzines por aí, “culpa” da tal da internet, as folhas de papel têm voltado a “voar” por aí em envelopes. Elas cruzam o país, quiçá outras fronteiras, e encontram pessoas interessadas em absorver seu conteúdo – geralmente algo feito “à mão”. “Manufatura” é assim. Feito pelo veterano Flávio Grão ele tem uma tiragem limitada, mas que pode adentrar na “vilã” internet para chegar a um número infindável de pessoas. Esse e outros assuntos foram abordados na nossa conversa com o autor Grão, mestre na arte de produzir zines e cultura independente nos mais variados formatos. Confira a entrevista!

Qual foi o estalo que você teve que te levou a voltar a fazer um fanzine depois de 10 anos “parado”?
Grão: Nestes 10 anos de hiato fiquei me deslumbrando com a internet (risos). Brincadeira! No final dos anos 90 parei de fazer fanzines porque após publicar nove zines de contos – “Histórias Para Ler no Banheiro” e “333” – fiquei meio saturado de escrever e também porque saí do trabalho onde xerocava tais produções. Passei então a década dos “00” pintando, tocando e colocando alguns desenhos na internet.

Aí veio a volta...
Grão: Voltei a fazer fanzine no final do ano passado depois de uma crise – no bom sentido. Essa crise surgiu quando comecei a pensar criticamente no tempo que me dedicava para pintar os quadros (meses) e no destino deles, que geralmente iam parar na parede, da minha ou de outra casa, para serem vistos por um número mínimo de pessoas. A grande motivação para que eu faça arte é o prazer que há nesta atividade, mas tão importante quanto isso é a necessidade – como artista – de que esta produção circule e que pessoas a vejam; senão é como aquela banda que só ensaia e nunca faz show ou grava. Vira uma produção autista – um ato de comunicação não finalizado. Mediante estas reflexões comecei a produzir ilustrações em preto e branco porque transmitiam minhas idéias de modo mais rápido, ocupam menos espaço e são mais fáceis de serem reproduzidas. Os desenhos desta época começaram a gerar outros desenhos e formaram sequências. Foi aí que deu o tal estalo e decidi fazer o fanzine “Manufatura”, pois seria um modo de oferecer tais sequências em um formato legal, relativamente barato e sem depender de ninguém.

Eu tenho uma teoria de que só quem já fez fanzine sabe dar o devido valor a este muitas vezes subestimado veículo de informação. Será que é ranzinza demais eu pensar assim?
Grão: Sim, pode apostar que nós somos ranzinzas sim (risos). Essa subestimação vem da ignorância do senso comum que possui um ponto de vista equivocado que considera o fanzine como uma “sub-revista” ou uma “revista amadora” e não o reconhece como gênero autêntico e dotado de suas próprias características. Quase todos os fanzineiros que conheço hoje fazem fanzine por uma opção consciente. E isto quer dizer que eles desejam emitir suas opiniões sem rabo preso, circular em um número restrito e – quase sempre – seleto de leitores e, principalmente, publicar por prazer.

O “Manufatura” é um fanzine, praticamente, sem palavras. O chavão diz que uma imagem vale mais que mil palavras, será que sem a escrita, a arte visual estimula mais o pensamento livre?
Grão: Eu acredito que a palavra é um elemento a mais que pode ajudar a direcionar certas interpretações. E minha escolha pela ausência delas é justamente para que haja essa lacuna para o leitor colocar seu pensamento, sua própria interpretação.

Ainda pensando nisso de não haver textos no fanzine, fiquei imaginando uma “trilha sonora” pra ele e só cheguei a conclusão que deveria ser algo instrumental. O quê você acha que combinaria com seus desenhos?
Grão: Eu também imaginei algo instrumental. Se pudesse escolher seria algo entre o Tortoise e as músicas instrumentais do Fugazi.

Por usar o papel vergé, que tem pequenas ranhuras, você deu aos seus desenhos do “Manufatura” um “movimento”. As linhas parecem “frescas”, que foram feitas há pouco, sabe?! Todo esse processo, unido ao modo artesanal como foi composto, me convence de que na tela fria de um computador ou se feito em grande escala, sua arte perderia um pouco sua vida. Você concorda com isso?
Grão: Sim, concordo, mas caímos naquele velho parodoxo da qualidade X quantidade. Se por um lado a imagem na internet é mais “pobre”, por outro é mais democrática e mais pessoas podem ter acesso a ela. Futuramente vou disponibilizar o “Manufatura” para ser folheado online, pois não gostaria que a baixa tiragem impedisse o acesso a alguém que quisesse ler.

O “Manufatura” está em sua primeira edição, ela é limitada em uma tiragem de cem fanzines. Essa opção foi mais pensando no lado econômico, financeiramente falando, ou para valorizar o resultado final mesmo? E quando vem o próximo número?Grão: Pensei sim no lado econômico, mas também pensei no resultado final, já que poderia produzir uma quantidade maior com uma qualidade pior. Quando pensei na tiragem de 100 pretendi limitar o alcance que o zine teria em termos de distribuição, divulgação etc. Tem também o lance de quando alguém pegar em mãos entender que é um produto de tiragem baixa, limitada, coisa que nem todo mundo pensa quando pega um fanzine, mas que acontece com quem compra uma gravura.

Mesmo me considerando uma pessoa frustrada no skate, olhar para algumas escadas dos seus desenhos parecem ser convites para descê-las num rockslide...
Enfim, o skate te influencia de alguma maneira na hora de desenhar?
Grão: Andei de skate na época mais “wild on the streets” e tinha a pista de SBC como quintal de casa. Também sou meio frustrado como skatista, nunca andei muito bem... É interessante notar que quem já andou de skate tem no subconsciente esse lance, essa forma particular e poética de se relacionar com as estruturas da cidade. E como tenho esses pensamentos enquanto desenho não dá pra negar que há uma influência, né?!

E no geral, quem e o quê te influenciam artisticamente?
Grão: Tenho uma influência muito ampla, gosto de muitos artistas e por motivos diferentes, como tipos de traço, motivos, cores. Esta influência, porém, não se restringe às artes gráficas. Toda a cultura do hardcore, por exemplo, sempre me influenciou muito. Ultimamente tenho estudado um pouco de Filosofia Chinesa e acho que isso também tem pegado forte no meu desenho. Também tem a influência do ambiente em que vivo, no caso o caos concreto de São Paulo.

Cara, acho impossível folhear o “Manufatura” e não pensar nos traços do holandês M. C. Escher, apesar de achar que ele desafiava mais a gravidade que você. Pelo que sei você só foi conhecer o trabalho dele depois de comentarem a semelhança, né?! Você acredita que esse é um simples caso de coincidência ou, tal qual Jung teorizou, de sincronicidade?
Grão: Acredito na sincronicidade sim. Como sempre gostei de desenhar escadas e tinha esse interesse em subverter as perspectivas, uma hora ou outra eu ia flertar com o universo do Escher, mesmo sem o conhecer. Admiro muito o seu trabalho, pois ele alia três habilidades em alto grau: o rigor matemático, a técnica precisa e uma inspiração que transcende a lógica.

As pessoas adoram rótulos, termos, definições... Se uma arte está num determinado museu ela é considerada clássica, se em outro ela é chamada de contemporânea. Se tá num muro, street art, num vitrine à venda, comercial... Complicado, né? A arte de Flávio Grão seria melhor definida como?

Grão: Eu defino como uma arte arcaica e rude (risos). Brincadeiras a parte não fico preocupado em me encaixar ou definir em nenhuma dessas classificações. Desenhar sempre foi um modo de entender o mundo e de me relacionar com ele. Isso é o que mais importa. O rótulo na verdade mais limita do que qualquer outra coisa. Reconheço, porém, algumas características comuns aos meus desenhos que são marcantes ao ponto de enquadrá-los em um estilo próprio, entre elas posso citar a “subversão” das formas, algo de autobiográfico – dizem que sempre desenho a mim mesmo –, o traço forte e marcado e à forte presença de texturas enervadas, que lembram a madeira.

Você fez algumas capas de discos e arte para bandas. Quando você faz esse tipo de trabalho, você se guia levando mais em conta a sonoridade ou as letras?

Grão: Ambas, contudo, na maioria das vezes, os músicos já têm uma ideia mais ou menos pré-determinada do que querem, e acabo dando um toque meu. O mais legal é quando me deixam a vontade e rola algo que satisfaz as duas partes, o CD “Faces do Terceiro Mundo” foi assim, e foi um CD cuja arte muita gente elogiou.

E seu lado músico, como anda? Você já tocou em diversas bandas desde lá dos anos 90, não?
Grão: Sim. Sinceramente sou um péssimo guitarrista e só tive bandas porque contava com a paciência de alguns generosos amigos que me deixavam tocar nas bandas que formavam (risos). Mas como estes amigos estão no ABC Paulista e estou morando em São Paulo é uma coisa que no momento tornou-se inviável.

Como artista, qual foi o trabalho que mais te deixou satisfeito – ou orgulhoso – em termos de reconhecimento?
Grão: É difícil de escolher um só, o já citado “Faces do Terceiro Mundo” foi um deles, teve também um linha de Shapes que fiz no começo dos anos 90 que gostei muito de fazer e, mais recentemente, o vídeo “Tinta Incrível”.

A linha de shapes foi feita pra quem?
Grão: Para a SIMS, entre os atletas me lembro que estavam o Fabio Sleiman, Rafael Gomes, Rafael Cabral, Negretti, etc. Foi um total de oito shapes.

E o “Tinta Incrível”?
Grão: Foi feito com filmagem de Vebis Jr., montagem de Rafael Armbrust e trilha do Parteum!

Pra encerrar, quando se fala em fanzine a gente sempre fica meio nostálgico. Então te pergunto, você acha que ainda exista algo sincero e/ou espontâneo no “do it yourself” nos dias de hoje?
Grão: Acredito que sim. A maioria das produções no underground começa com todas estas características positivas. Só que elas vão apodrecendo na medida em que o ego dos artistas cresce e toma um lugar central na história o que é um passo para que surja esse câncer que são as castas ou panelas dentro do próprio underground. Tudo isso é uma contradição, visto que agindo desta forma se reproduz os mesmos mecanismos de exclusão existentes no mainstream aos quais o underground deveria ser justamente uma alternativa! É bem triste porque a cidade de São Paulo que deveria ser uma Meca cultural alternativa acabou se tornando uma cidade dividida em sub-cenas arrogantes e impenetráveis. Diferente de outros lugares em que o underground luta por uma causa comum, aqui a cena briga entre si, arruinando a sua própria essência. Mas temos de ser esperançosos porque temos muitos exemplos de pessoas que não se corromperam – e nem se corromperão – com falsas ilusões e deslumbramento, produzindo algo visceral e honesto.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

LIVRETO CONCRETO



Fui convidado pelos amigos Bruno Kurrú e Renan Gaze a participar do projeto Vivência da editora Ôrganiza na mostra de arte urbana TRANSFER.

A idéia do projeto era produzir livretos de artistas em tiragem limitada e além disso, promover encontros e diálogos entre eles.



A editora Ôrganiza estava com um espaço para a produção na Mostra Transfer com alguns equipamentos como xerox, guilhotina e outros materiais que possibilitava autonomia para que os artistas produzissem o seu material na hora e no local.

No dia 10 de setembro, com uma merecida pausa para o almoço produzimos o livreto CONCRETO, com tiragem de 60 unidades.



O interessante da produção, é que tendo acesso ao xerox, pude colocar em prática algumas idéias que não pude concretizar anteriormente pela distância entre o balcão e a bendita máquina. Uma destas idéias foi fazer uma capa com papel vegetal e poder fazer capas diferenciadas para todos os livretos.



Agradeço aos amigos Renan e Bruno pela convite, e principalmente pela iniciativa de pensar na arte de uma forma mais expansiva e coletiva.



+ sobre a editora ôrganiza:
http://editora-organiza.blogspot.com/

+sobre a mostra de arte urbana TRANSFER:
http://transfer.art.br/



quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Resenha MANUFATURA



O blog cartundoounada fez uma breve resenha sobre o livreto MANUFATURA.

Este é o fanzine feito pelo Flávio Grão: Manufatura, um fanzine de suas ilustrações. Impresso em preto e branco no papel vergê, tem o tamanho A6 (10,5 x 14,8 cm) possui algumas narrativas sem textos, dadas pelas belas imagens. Vale a pena adquirir!


Recomendo ainda que conheçam o trabalho do Rodrigo e de seu amigo Pôneis em seu belíssimo fanzine LA PERMURA.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

OLD TIMES I


àgua suja de nanquim sobre canson

OLD TIMES II


Água suja de nanquim sobre canson.

LEITURA OPCIONAL A PARTIR DAQUI - SPOILERS SOBRE O DESENHO

Fiquei pensando um pouco sobre como nos constituímos como artistas, quais são os movimentos, passagens, vivências que marcam nosso trabalho e (que por vezes) podem ser identificados.

A vivência que tive (ou tenho) com o movimento, ou música punk e hardcore tem sem dúvida um peso sobre os trabalhos que faço, seja em temas (mais raro) ou em atitude (mais comum).

De qualquer forma ao fazer este desenho pensei nisso, tentando imaginar como seria um icone que representasse graficamente tal vivência. Utilizei esta técnica ingrata da água suja do nanquim que dá um aspecto de desenho antigo. Dois artistas me vieram na cabeça, Will Eisner e Hopper. O primeiro por utilizar esta técnica e o outro porque trata das lembranças quase apagadas em sua obra.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

SOBRE NUVENS E A MORTE











LEITURA OPCIONAL A PARTIR DAQUI


Os últimos dois desenhos fiz recentemente pensando sobre o que me traduzia a morte de um amigo dos tempos de adolescente.
É interessante pensar nas metáforas que temos a respeito da morte e do céu, o inatingível e as nuvens.
Fiz uma coletânea destas imagens para este post.
De qualquer forma, o primeiro desenho chama-se karma e acho que explica muito do que acredito a esse respeito.
RIP

AQUARELA



LEITURA OPCIONAL A PARTIR DAQUI

Parece que enfim começo a me entender com a aquarela depois de décadas.
Sempre foi uma técnica cascuda para mim, a tinta (pigmento extremamente diluído na água) é tinhosa, melindrosa, segue e desliza e imprime-se da forma que lhe convir - praticamente um jeito fêmea de se portar...hehe

Através de uma conversa com um colega desenhista estes dias, percebi que seria importante tentar trabalhar isso, essa paciência, essa leveza que a aquarela possui, justamente talvez em busca de um novo caminho, visto que considero o meu modo de pintar e desenhar um pouco oposto a isso, algo carcado, bruto e teimoso.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

OUT OF STEP - MINOR THREAT



Don´t smoke
Don´t drink
Don´t fuck
at least i can fuck think

I can´t keep up
can´t keep up
can´t keep up

OUT OF STEP WITH THE WORLD



xxx

LEITURA OPCIONAL A PARTIR DAQUI

Fiquei pensando que uns 20 anos depois de conhecer o Minor Threat com o estudo do budismo e a tentativa da prática do desapego comecei a entender um pouco melhor tal música.

Hoje em dia, quem procurar vai encontrar justificativa pra tudo, até mesmo para o mais absurdo como por exemplo matar um semelhante. Pode estar em um livro, um video, tudo bem justificado, com analogias e a mais bela retórica.

E quantas vezes o senso comum, a mídia e a propaganda nos fazem agir no automático sem que paremos para questionar por um segundo se o que fazemos é certo ou não?

É mais fácil deixarmos o barco correr na corredeira de mediocridade de caráter e depois nos fazermos de vítima quando estamos em uma situação desgraçada por conta de nossas próprias atitudes.

É preciso se manter "fora do passo" com o mundo...

quinta-feira, 29 de abril de 2010

nova tela 20 x 30 cm - óleo



Leitura opcional:

Pintado em uma tacada só, de um tamanho que coubesse no escaneador de imagens.
Prefiro pintar as virtudes, mas de vez em quando tenho que lidar com os fantasmas da alma, e melhor encerrá-los em uma tela do que soltos por aí.
Ou não?

terça-feira, 20 de abril de 2010

MANUFATURA - VISTA # 28

Saiu uma pequena resenha do MANUFATURA na revista vista # 28.

Você pode fazer o download da revista aqui.



Reprodução do texto:
"ZINE - A Vista mais do que apóia, lê e repassa todos os zines que tem acesso. Para representar todos segue aqui uma imagem da mais nova produção de Flavio Grão, cidadão que desde 1995 colore, ilustra e escreve em livretos produzidos pela pura paixão. Para saber mais sobre esse verdadeiro artista confira entrevista com ele falando do The Anwser até Manufatura, no site da Vista."

Observação 1: Embora a matéria fale sobre uma entrevista no site, esta não rolou devido a alguns desencontros de tempo e espaço.

Observação 2: Fiz questão de colocar a foto ao lado do zine, a do Sr. Ian Mackeye (vide Minor Threat e Fugazi) que para mim representa uma referência da integridade e coerência, raridade nos dias atuais.
ALIÁS, as redes sociais são um câncer do qual faço parte, facebook, orkut e etc, e nelas tenho visto manifestações de artistas independentes (ou não) que me deixam um tanto assustado.
Nestas manifestações prevalecem um pensamento reacionário e a reprodução de idéias ou conceitos da grande mídia o que me faz pensar, de onde vim, onde estou e para onde vou... Será que foi a chegada do "Sonho Médio" que acalmou os ânimos ou dopou o instinto contestador? Ou será questão de berço e que o hardcore/ punk foi só uma fase estética que envolvia algumas atitudes (além de contrariar o gosto musical de papai)?
Sei lá, dá para pensar um bocado, inclusive nas minhas atitudes. Vou tentar tirar uma lição disso.

sexta-feira, 19 de março de 2010

ENTREVISTA BLOG SIRVA-SE



Cedi uma entrevista em janeiro de 2010 para o blog Sirva-se através do artista e fanzineiro Daniel Hogref.

Segue abaixo a entrevista.

Grão, você já é fanzineiro há um bom tempo, conta pra gente como você começou a se envolver com esse universo.
Desenho desde muito cedo, acho que desde os três ou quatro anos. Na escola, acho que na quinta série, eu e um amigo, Marcelo Viegas, começamos a fazer um jornalzinho escolar que não foi para frente, o nome era Óia, tipo uma sátira da Veja com caricatura dos professores, alunos, este tipo de humor escolar. Depois, com uns 16 anos andava com uns punks do ABC e fiz meu primeiro fanzine que se chamava Inconformados. A tiragem foi mínima, uns cinco ou seis…

Meu primeiro fanzine sério foi por volta de 1995, o The Answer em parceria com o Viegas, o mesmo da revista Óia, hoje editor da revista 100% Skate, e parceiro no blog Zinismo. Depois, fiz dois fanzines de contos, um se chamava Histórias para ler no banheiro e era uma coletânea de contos do pessoal do “Udigrúdi” do ABC e durou três edições. O outro se chamava 333 e era um fanzine somente de contos meus, durou seis edições. Esses dois fanzines foram idealizados e publicados entre 1998 e 2000.

E o que aconteceu que te fez ficar parado por 10 anos?
Na verdade em 2000 eu saí do trampo onde eu xerocava os fanzines clandestinamente e nesta mesma época, por coincidência ou não, comecei a tocar em bandas e me dedicar mais à pintura. Além disso, a Internet começava a ficar mais acessível, então os textos ou desenhos que fazia, divulgava na rede (fotolog, blogs, etc). Porém chegou uma hora em que senti falta de fazer algo mais útil, e não ficar só divulgando minhas coisas. Havia também a vontade de fazer algo coletivamente. Foi aí que surgiu a idéia do blog Zinismo. Na verdade eu já vinha conversando com alguns amigos sobre a intenção comum em fazer um zine virtual que pudesse agregar a escrita com as tecnologias de mídia (vídeo, música, etc.) e o blog foi o modo de concretizar isso.


O que te animou a lançar o zine Manufatura?

Teve uma época em que estava pintando demais e fiquei pensando na utilidade daquilo tudo, minhas paredes estavam cheias de quadros… Fiquei me sentindo meio estranho com tudo aquilo. Percebi que deveria me dedicar mais às ilustrações, pois além de ocuparem menos espaço, são meios mais “democráticos” e mais fáceis de serem reproduzidos e enfim, divulgar a mensagem ou a viagem que eu pretendia com as imagens feitas. Mais ou menos nesta época comecei a pensar que os desenhos, como qualquer coisa que fazemos, nunca são neutros. Sempre que alguém vê ou consome algo que você faz, você passa algo nem que seja de forma inconsciente. Foi aí que comecei a prestar mais atenção no que fazia e assim surgiram as duas seqüências de desenhos que formaram o Manufatura. Atualmente não consigo fazer um desenho solto, faço algo, um símbolo, ou um personagem… Depois o deixo lá, maturando. Volto e complemento algo e assim vão formando-se seqüências de ilustrações. Bem, prontas as seqüências senti vontade de colocá-las na devida ordem e disponibilizá-las de forma que as pessoas pudessem ter a mesma sensação (ou não) que tive ao complementar a seqüência de desenhos. O veículo ideal foi o fanzine. Poderia até ter tentado fazer uma animação, mas acho importante o intervalo entre uma página e outra para o cérebro captar algumas nuances.


Algo que percebi como bem forte nesse seu trabalho foi o uso da madeira, mesmo que desenhada. Tem gente de madeira, objetos de madeira e até nuvem de madeira, parece até meio que uma obsessão! Qual é a sua com a madeira? O que ela significa pra você?


Sempre gostei das hachuras nos desenhos e teve uma época em que comecei a carregá-las mais, fazer algo mais grosso e marcado, pirava nos efeitos de xilogravura. Paralelo a isso, na pintura, comecei a fazer algo mais cubista, resumindo as formas. Juntando tudo isso, vi que as coisas que eu estava fazendo vinham ganhando naturalmente esse aspecto de madeira, daí comecei a investir em cima desse estilo mesmo.
Na real, a madeira tem vários significados para mim que foram mudando conforme fui envelhecendo. Ela representa, por exemplo, o que é rústico e antigo, me lembra valores esquecidos, como a honra e a honestidade. Por outro lado quando pinto quadros, costumo fazer um processo de síntese de idéias. Vários rascunhos dão origem a um desenho ou símbolo final e essencial. De certo modo isso se relaciona com o processo de escultura na madeira que considero um processo muito trabalhoso e solene. Ninguém faz algo na madeira se não tiver certeza do que é importante, pois dá muito trabalho. Para firulas efêmeras temos o plástico. Além disso, meu avô era carpinteiro, será que é genético? Não sei,pode ser…

Você faz também umas perspectivas meio estranhas, umas coisas meio irreais, me lembram de longe o M.C. Escher. É uma influência pra você? Quem mais você citaria como influência?
Na verdade, conheci os trabalhos do M. C. Escher por meio de um amigo que notou alguma semelhança com meus desenhos e veio me mostrar. E como não poderia deixar de ser, tornou-se uma influência imediata. Gosto do tipo de obsessão e respeito que ele tem pela ilustração. Aliás, com a ilustração tenho uma influência meio ampla, dependendo até de que tipo de material que uso. Na ilustração em preto e branco, gosto do Crumb, Will Eisner (das HQs), mas para mim, o mestre mesmo nas ilustrações é o Gustave Doré, imbatível. Já na pintura gosto de muitas coisas distintas e acho que elas me influenciam sutilmente por motivos diferentes. Por exemplo, gosto do modo como os artistas russos (da época da revolução comunista) transmitiam o máximo de informação economizando em cores e signos. Também gosto dos movimentos de um pintor como Francis Bacon e da impressão que arte óptica causa nos observadores. É um caldeirão de misturas e influências.

Você começou fazendo zines sobre música e contos, com conteúdo escrito, e o Manufatura traz só ilustrações. O que você acha que muda de uma linguagem pra outra?
Quando eu escrevo contos ou qualquer tipo de texto, não há muita variação entre o que eu penso e o que as pessoas vão entender. Já com as ilustrações, esse entendimento fica mais aberto a interpretações pessoais, um recurso que procurei explorar no Manufatura.

Já vi gente dizer que por ser feito em Xerox, o fanzine perde o valor artístico. O que você acha disso? Você acha que suas ilustrações tem menos valor xerocadas do que se fossem feitas em serigrafia, por exemplo?
Depende. Com relação ao Manufatura, quando fiz o desenho em preto e branco e cheio de hachuras, já imaginava que o tipo ideal de reprodução seria o xerox. Se fosse para fazer em serigrafia, faria uma outra linguagem diferente e não sequencial, provavelmente com cores chapadas. Mas temos que pensar também no objetivo das coisas que fazemos, se fizesse em serigrafia aumentaria demais o custo de tudo e teria que vender por um preço mais salgado e acabaria encalhando minha produção, e para o momento era a última coisa que gostaria que acontecesse. Penso que o ilustrador tem que buscar a harmonia entre a técnica e o objetivo e tomar cuidado para não pensar no suporte apenas como forma de valorizar seu trabalho, a não ser que haja demanda e compradores para isso, é claro! Temos que pensar na diferença entre o valor artístico e o financeiro, e, como vivemos em uma sociedade onde o que comanda é o financeiro, é natural que essas idéias se confundam em nossa mente a toda hora. Mas aí, o Manufatura é de graça, mas isto significa que ele vale nada, ou justamente o contrário?

De um tempo pra cá comecei a ver zines mais trabalhados, feitos com um papel melhor, com cortes e formatos diferenciados, tiragem limitada, algo bem mais artístico mesmo. Você acha que isso pode ser um caminho pra resistência dos fanzines impressas nessa era digital?

Sem dúvida acho que esse é o caminho. Quando o Zinismo fez um ano, escrevi justamente sobre isso. Com a facilidade de se publicar coisas na internet, a publicação de um fanzine é um ato político, algo que alguém resolveu registrar de modo independente. A internet é rápida e barata, mas as informações se perdem muito facilmente. E quanto aos formatos e tiragem, quem for ligeiro e tiver esta percepção, certamente vai nesse caminho de caprichar mesmo na sua produção e obter diferenciais, embora isso nem seja tanto novidade, pois nos anos 90 já havia zines com capas feitas, por exemplo, em xilo.


Fazer capa de CDs é sonho de muito moleque. Você já fez capas de várias bandas do underground nacional, incluindo o clássico split “Faces de Terceiro Mundo”. Conta ai como é que rolaram esses contatos e o que tem de bom e ruim em trabalhar nesse meio.

Esses contatos rolaram muito através dos zines que fazia e também porque, além de tocar em algumas bandas, sempre fui muito em shows e tal. Mas hoje em dia, creio que a internet também é um caminho legal, isso ajuda a “carimbar” seu nome. O legal de ter o trabalho impresso, seja em CDs, shapes e revistas, é que você passa seu trabalho pra frente, multiplica sua idéia, o ruim é que não rola sempre!

Já que você é especialista no assunto, cita alguns zines interessantes que estão sendo feitos pelo Brasil afora.
Na verdade se me declarasse especialista no assunto eu estaria sendo injusto com muita gente que não ficou dez anos sem fazer zine e certamente mereceria ser malhado em praça pública! Enfim, se há seis meses você me perguntasse se ainda existem zines de papel no Brasil eu ficaria em dúvida… Mas quando voltei a publicá-los, percebi que tem muita gente fazendo com que esta cultura permanece viva e que praticamente só tem acesso a ela quem também faz fanzine ou ainda, quem corre atrás, faz muita questão. Recebi alguns zines neste tempo e acho que não poderia deixar de citar o Aviso Final, que tem quase 20 anos dedicados à causa. Faz tempo que não leio, mas também gosto do Antimídia, um zine que o povo gosta de malhar, mas que tem muito crédito por ser de graça, ter uma tiragem enorme e muita informação relevante. Outro fato que achei legal foi o de perceber que tem gente fazendo fanzines mais voltados à arte, como o Quase e o Subsolo – Ruas do ABC, que é dedicado à arte de rua e pixação.

Então é isso cara, obrigado pela atenção! Espaço aberto pra falar o que quiser.

Se as portas não se abrem, que tal criar novas portas???

Este é o link original da entrevista.

MANUFATURA



Publiquei em janeiro o #1 do fanzine/livreto de ilustrações chamado MANUFATURA.

Reproduzo abaixo, na íntegra, a resenha feita pelo Edu Zambetti para o blog ZINISMO:

MANUFATURA

por Edu Zambetti

Algo entre os traços de M.C Escher e Robert Crumb, entre a distorcida visão do mundo e os desejos mais íntimos do indivíduo, ainda entre o indivíduo em conformidade com o todo e vice versa, tudo isto faz parte das reflexões apontadas de forma peculiarmente sutil através das ilustrações de Flávio Grão neste nº1 de seu Livreto/Zine intitulado “Manufatura”.

Com uma pequena tiragem inicial, cada exemplar vem numerado manualmente e traz duas sequências trabalhadas em nanquim sobre papel (posteriormente reproduzidas em vergê) que apontam para uma disposição do artista em manifestar certo afastamento das regras e estereótipos que conduzem nosso mundo atual.

Na sequência intitulada “Escadas”, Grão parece refletir sobre a existência de um possível equilíbrio entre todas as coisas a partir da superação por parte de cada pessoa de suas próprias limitações ao mesmo tempo em que isto altera seu modo de entender e atuar no universo concreto.

De “Ego Harakiri”, última sequência de ilustrações do ”Manufatura”, salta a preocupação sobre como todas as buscas, manias, medos e anseios podem consumir o indivíduo, refletindo uma imagem muitas vezes distorcida dele perante o coletivo enquanto, simultaneamente, distorce sua própria visão sobre a realidade deste mesmo coletivo. Ainda neste universo pictórico, o mundo altera o indivíduo e este altera o mundo num movimento muito menos radical e caótico do que sutil e harmonioso.

No final deste zine de papel com traços de filosofia em forma de arte, conspiratória ou não, underground ou não, fica uma questão entre tantas:

“A história do indivíduo vem de sua real superação em relação a si e ao todo?”


A postagem original segue nesse link.

POR QUE BLOG?



Pensei no blog como modo multi-mídia de reunir minhas produções. Essa ferramenta, além de permitir que eu escreva mais, permite a disponibilização de imagens, videos, aplicativos,links, de modo interativo.

Pretendo também colocar mais informações sobre os bastidores e processos dos trabalhos, além de algumas opiniões e análises.